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Babadook e a Ansiedade

  • Foto do escritor: Bruno Soares
    Bruno Soares
  • 25 de fev.
  • 4 min de leitura

Sigmund Freud, o pai da psicanálise, desenvolveu uma compreensão profunda da ansiedade, considerando-a um fenômeno psíquico central. Freud acreditava que a ansiedade desempenha um papel fundamental na organização do aparelho psíquico, resultando de conflitos entre os sistemas inconscientes e conscientes da mente. A ansiedade, segundo ele, poderia ser dividida em três tipos: a ansiedade neurótica, a ansiedade realista e a ansiedade moral. Esses conceitos oferecem uma lente através da qual podemos entender os mecanismos psicológicos por trás de muitos filmes de terror, que frequentemente exploram medos profundos e angústias internas. Para ilustrar esses tipos de ansiedade, relacionaremos os conceitos freudianos com o filme O Babadook (2014), dirigido por Jennifer Kent.


A ansiedade neurótica: o medo do desconhecido e o inconsciente reprimido


Freud descreveu a ansiedade neurótica como uma resposta irracional e desproporcional a uma ameaça que não é diretamente aparente ou compreendida. Ela está enraizada no inconsciente e geralmente se manifesta como um medo que parece não ter causa clara, mas que está intimamente ligado aos desejos reprimidos e impulsos do id. Esses impulsos reprimidos podem ameaçar vir à tona e desafiar o controle que o ego exerce sobre o comportamento.


No filme O Babadook, a ansiedade neurótica é uma das forças centrais que movem a narrativa. Amelia, a protagonista, vive em luto pela morte de seu marido, que morreu em um acidente de carro enquanto a levava para o hospital para dar à luz ao filho, Samuel. A presença constante do luto não resolvido e da repressão de sua dor torna-se uma força que molda suas interações com o filho, e o monstro Babadook funciona como uma representação física dessa angústia reprimida. Amelia nunca processou completamente a morte de seu marido, e o Babadook pode ser visto como uma manifestação simbólica do trauma reprimido que ela se recusa a confrontar.


A ansiedade neurótica de Amelia se intensifica à medida que o filme avança, com a criatura do Babadook ganhando força à medida que ela tenta, inutilmente, suprimir sua dor e medo. O monstro age como uma força do inconsciente, invadindo sua vida e exacerbando seus medos. A sensação de descontrole que Amelia experimenta ao tentar lidar com o filho e com o monstro é uma representação simbólica de como a ansiedade neurótica funciona: o ego de Amelia está constantemente ameaçado pela força dos impulsos inconscientes que ela reprime. Nesse sentido, o filme oferece uma poderosa metáfora da ansiedade neurótica, ilustrando como o medo do desconhecido e do inconsciente reprimido pode ser aterrorizante.


A ansiedade realista: o medo concreto e palpável


A ansiedade realista, de acordo com Freud, é a resposta emocional a uma ameaça percebida no mundo exterior, sendo assim a forma mais prática e concreta de ansiedade. Ela surge da percepção de perigo real ou iminente, e sua função é alertar o indivíduo sobre a necessidade de agir para evitar ou enfrentar esse perigo.


No caso de O Babadook, a ansiedade realista se manifesta no medo genuíno que Amelia e Samuel sentem diante da presença da entidade Babadook. Inicialmente, o medo que eles experimentam parece ser algo externo – o monstro está lá, fisicamente representado, aterrorizando a casa e suas vidas. Este é um medo concreto, palpável, uma ameaça à segurança física de ambos. Assim, o filme utiliza de forma eficaz a ansiedade realista ao criar cenas de tensão que envolvem a possível invasão do monstro em seus espaços pessoais, como seus quartos e a casa como um todo.


No entanto, o filme vai além de uma simples narrativa de terror, pois à medida que o espectador se aprofunda na história, torna-se evidente que a verdadeira ameaça não é externa, mas interna. A ansiedade realista funciona como uma camada inicial que, mais tarde, se entrelaça com a ansiedade neurótica de Amelia. Essa combinação de medos concretos e ameaças internas reprimidas forma a base do terror psicológico no filme, revelando como o medo realista pode ser um gatilho para desestabilizar ainda mais o ego, especialmente quando combinado com conflitos inconscientes.


A ansiedade moral: a culpa e o superego punitivo


A terceira forma de ansiedade freudiana é a ansiedade moral, que surge quando o superego entra em conflito com o ego. O superego, segundo Freud, representa os ideais morais e éticos internalizados pela pessoa, muitas vezes influenciados pela educação, cultura e sociedade. Quando o ego toma decisões ou age de maneira que entra em conflito com os padrões elevados do superego, a pessoa pode experimentar sentimentos de culpa, vergonha e uma profunda ansiedade moral. Essa forma de ansiedade está intimamente ligada ao conceito de culpa e ao medo de ser punido por suas transgressões.


No filme, Amelia lida com uma enorme carga de culpa que se manifesta como ansiedade moral. Ela se culpa, consciente e inconscientemente, pela morte de seu marido, e essa culpa a impede de se conectar de forma saudável com seu filho, que acaba se tornando um lembrete constante da tragédia. O Babadook, nesse sentido, também pode ser interpretado como uma personificação dessa culpa e autocensura que Amelia experimenta. A figura do Babadook a assombra, assim como a culpa não resolvida pela morte do marido, e sua presença constante a impede de se libertar dos grilhões emocionais que a mantêm presa a essa dor.


A ansiedade moral que Amelia experimenta, combinada com a ansiedade neurótica e realista, cria um panorama emocional devastador que a leva à beira do colapso. A luta interna de Amelia com suas próprias emoções e a presença esmagadora de sua culpa são, na verdade, os maiores vilões do filme, enquanto o Babadook assume o papel de catalisador para essas emoções reprimidas.


A análise freudiana da ansiedade oferece uma poderosa ferramenta para explorar os temas psicológicos e emocionais por trás de filmes de terror como O Babadook. Ao examinar como a ansiedade neurótica, realista e moral influenciam o comportamento de Amelia e moldam os eventos do filme, podemos ver como o terror psicológico é construído a partir de medos internos profundos e conflitos não resolvidos. O Babadook vai além de ser um simples filme de terror ao explorar a psique de sua protagonista, mostrando como o medo e a ansiedade podem assumir formas monstruosas quando reprimidos por tempo demais. Assim, o filme se torna uma rica ilustração dos mecanismos da mente humana, tornando-se uma narrativa tanto de terror quanto de autodescoberta psicanalítica.


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